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A reciclagem não é uma solução milagrosa no combate à poluição causada por plástico. Eis o porquê …

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Os plásticos são convenientes, indubitavelmente facilitando as nossas vidas. São baratos, leves, duradouros e resistentes à água e ao petróleo. Porém, esquecemo-nos com frequência que são materiais duradouros, pelo que, sempre que os utilizamos no fabrico de produtos concebidos com uma vida útil muito curta – talvez até de utilização única –, estamos a desenvolver um ciclo insustentável. A nossa utilização indiscriminada de plástico criou uma crise global em matéria de gestão de resíduos, cujas consequências são atualmente evidentes. Montanhas de plástico flutuam nos oceanos e prejudicam a vida marinha, os microplásticos vão parar aos nossos alimentos e bebidas e até ao nosso organismo.

Frequentemente, apresenta-se a reciclagem como solução – mas será uma solução efetiva e viável?

 

É indiscutível que a reciclagem de materiais como vidro, papel e alumínio constitui um passo substancial no sentido de uma economia mais circular e de um estilo de vida sustentável. A título de exemplo, o alumínio é um material infinitamente reciclável – aproximadamente 75% da totalidade de alumínio alguma vez produzido ainda se encontra em utilização, podendo continuar a ser reciclado e reutilizado.

 

Já não se poderá dizer o mesmo dos plásticos. Ao contrário do alumínio, um pedaço de plástico apenas pode ser mecanicamente reciclado quatro ou cinco vezes, em termos médios (dependendo do tipo, toxicidade e qualidade), até que a respetiva qualidade diminua a um ponto em que deixe de ser possível mantê-lo no circuito em segurança. Nesse momento, transforma-se num resíduo não utilizável, contribuindo para a acumulação de resíduos de plástico. Adicionalmente, a reciclabilidade do plástico diminui em função da mistura de aditivos, tais como plastificantes e outras moléculas do tipo hormonal (por exemplo, Bisfenol A) e, em particular, corantes. Sempre que o plástico é reciclado, são adicionadas resinas plásticas virgens de modo a manter propriedades como a integridade e a elasticidade. Tal significa que, sempre que compra uma garrafa feita de plástico reciclado, apenas uma parte da mesma é efetivamente produzida com plástico reciclado, provindo o restante da produção de plástico completamente novo. Paradoxalmente, até a reciclagem de plástico requer a produção de plástico novo!

 

Existem complicações adicionais que fazem do plástico um material pouco atrativo para reciclagem. Primeiro, de modo a serem reciclados, os resíduos de plástico devem ser completamente limpos, não devendo existir quaisquer vestígios de petróleo ou de qualquer outro tipo de poluente. Depois, os vários tipos diferentes de plástico devem ser separados isoladamente. Esta é a razão pela qual – ao contrário do alumínio – apenas 9% das mais de 8 mil milhões de toneladas de plástico produzido foram efetivamente reciclados desde a década de 50. Os 91% remanescentes encontram-se ainda em aterros sanitários, nos nossos oceanos e praias, nos nossos sótãos e caves, na medida em que, naturalmente, não tenham sido incinerados, libertando materiais tóxicos.

 

Os dados recentes das Nações Unidas, do Fórum Económico Mundial e da Scientific American evidenciam que a reciclagem de plástico, por si só, não oferece uma solução para o problema da acumulação de plásticos no ambiente. Pelo contrário, a única opção viável consiste em evitar de forma rigorosa os resíduos. Sempre que existam alternativas, o plástico deve ser substituído por materiais mais biodegradáveis e ecológicos. Em todos os outros contextos, sempre que possível, os produtos de plástico devem ser reutilizados, por exemplo, através de Sistemas de Depósito e Devolução. Atualmente, somos finalmente confrontados com os prejuízos que criámos, devendo agora questionar seriamente o impulso de consumo que deu origem à nossa sociedade de desperdício.

 

Durante os próximos meses, todos os Estados-Membros procederão à transposição da Diretiva da UE sobre plástico de utilização única. Tal constitui uma excelente oportunidade para lidar com a crise de poluição causada por plástico na sua origem. A Seas At Risk e a respetiva organização-membro portuguesa, a Sciaena, gostaria de recordar aos governos que a reciclagem tem os seus limites. O futuro reside na prevenção dos resíduos, na reutilização e no desenvolvimento de alternativas aos produtos de plástico. Os governos com visão estabelecerão regras com perspetivas ambiciosas, permitindo à sociedade dar um importante passo no sentido da redução substancial de resíduos de plástico, conjuntamente com um modelo de consumo verdadeiramente sustentável e com a restauração da vida marinha no nosso oceano.

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