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ICCAT e NEAFC marcam passo no caminho para a pesca sustentável no Atlântico

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Como acontece todos anos, em meados de novembro estiveram reunidos dois dos principais Organismos Regionais de Gestão de Pescas do oceano Atlântico, a Comissão Internacional para a Conservação dos Tunídeos do Atlântico (CICTA – ICCAT em inglês) e a Comissão das Pescarias do Nordeste do Atlântico (CPNEA – NEAFC em inglês). A Sciaena seguiu as reuniões dos dois organismos e, apesar de algumas medidas positivas, constatou mais uma vez em como ambas marcam passo no caminho para assegurar ecossistemas saudáveis capazes de sustentar pescarias sustentáveis.

A NEAFC é a organização responsável pela gestão de stocks de pequenos pelágicos como a sarda ou o verdinho, mas também de várias espécies e ecossistemas de profundidade no Atlântico Nordeste. Em 2023, a 42ª reunião anual desta comissão decorreu em Londres, de 14 a 17 de novembro. Em termos de conservação, foram dados importantes passos na proteção das espécies de profundidade, com a proibição de captura do tubarão-sardo , uma espécie classificada, pela Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), como “Criticamente Ameaçada” nesta região. Este ano, destaca-se ainda um profundo compromisso na conservação de várias espécies sensíveis de elasmobrânquios, agora abrangidas por uma medida de proibição de pesca: 9 espécies de quimeras, 3 espécies de raias de profundidade, 17 espécies de tubarões de profundidade e ainda o tubarão-frade.

Numa reunião marcada por vários impasses e indecisões, há que destacar uma decisão positiva – a abertura do Grupo de Trabalho para o Futuro Desenvolvimento da NEAFC aos observadores, o que permitirá uma maior transparência e responsabilização nas tomadas de decisão deste órgão de gestão. 

Em paralelo, nos dias 13 a 20 de novembro, decorreu no Novo Cairo, Egito, a 28ª reunião anual da ICCAT, organização responsável pela gestão dos atuns, espadartes e outros grandes pelágicos do Atlântico, stocks de enorme importância ecológica e económica para os mais de 50 países membros e da qual Portugal é membro fundador. Depois de em 2022, em Vale do Lobo, a reunião da Comissão ter ficado marcada por várias decisões positivas, em 2023 os trabalhos ficaram marcados pelo adiamento na tomada de decisões cruciais e cada vez mais urgentes, face ao agravar das crises da biodiversidade e do clima.

Talvez a mais significativa tenha sido a incapacidade, pelo segundo ano consecutivo, de adotar uma nova medida de gestão para o atum-patudo, atum-albacora e gaiado – os chamados atuns tropicais – espécies cruciais para as frotas atuneiras dos Açores e da Madeira e para muitos outros países. Em 2024 a ICCAT terá de encontrar uma forma de ultrapassar este impasse e aprovar uma nova medida que assegure o bom estado destes três stocks, pois só assim será possível assegurar a sustentabilidade das pescarias e das comunidades que dele dependem.

Outra área em que a reunião de 2023 desiludiu foi a dos procedimentos de gestão, que permitem fazer uma gestão plurianual com previsibilidade e precaução, incorporando objetivos de conservação dos stocks e da biodiversidade associada. 2024 terá de ser um ano determinante para a ICCAT, já que terá de recuperar o tempo perdido pelo adiamento da tomada de duas decisões que pareciam certas na antecipação da reunião de 2023 – a adoção de procedimentos de gestão para o gaiado ocidental e o espadarte do Atlântico norte, o último de grande importância para Portugal e para a sua pescaria de palangre de superfície

Também para outras espécies importantes para a pescaria nacional de palangre de superfície – o tubarão azul, as decisões ficaram aquém do necessário. Apesar da aprovação de medidas que reduzem os limites de captura e estabelecem uma chave de repartição das capturas para o stock do Atlântico sul, estas mantêm riscos elevados de manter ou precipitar a espécie para uma situação de sobreexploração.

Em termos de notas positivas, destacam-se as medidas de proteção aprovadas para várias espécies sensíveis, como o tubarão-baleia, as jamantas e as tartarugas. De destacar ainda a aprovação de disposições relativas à Monitorização Eletrónica Remota, medida que vai ao encontro da revisão recentemente aprovada do regulamento de controlo de pesca da UE que pretende colocar as frotas de pesca europeias no caminho da digitalização, rastreabilidade e responsabilização, protegendo os pescadores e frotas que cumprem as leis e respeitam a ciência.

Em geral, as reuniões das duas organizações ficam novamente marcadas pela falta de transparência, pela limitado acesso e possibilidade de intervenção dos observadores (incluindo as organizações de conservação) e pela relutância em aprovar medidas claras em relação ao bom estado ambiental dos ecossistemas de que as pescarias dependem e, em particular, sobre a mitigação dos impactos das alterações climáticas.

Em conclusão, apesar de ter havido decisões positivas tanto na ICCAT como na NEAFC, é importante reconhecer que estas organizações têm ainda um longo caminho a percorrer de forma a serem mais transparentes e mais inclusivas, incorporando de forma mais efetiva as ONG e assumindo a conservação como o seu propósito central, inclusivamente para garantir pescarias resilientes e sustentáveis. As duas organizações precisam ainda de agilizar os seus processos, no sentido de tomar decisões mais rapidamente, com mais precaução ambiental e com considerações não apenas sobre os stocks mais valiosos do ponto de vista comercial, mas também sobre as espécies associadas e o ecossistema como um todo, de forma a mitigar os efeitos e as causas das crises da biodiversidade e do clima, pois só assim as pescarias podem assegurar a sua continuidade no Séc. XXI.

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