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3ª UNOC traça novos caminhos para a conservação do Oceano mas agora é preciso navegá-los

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Terminou no dia 13 de junho a terceira Conferência do Oceano das Nações Unidas (UNOC, em inglês). Vários anúncios positivos foram feitos, nomeadamente por Portugal, e fica agora a expectativa sobre os passos que serão tomados para implementar as medidas na prática, assegurando a proteção efetiva do Oceano. A Sciaena esteve presente e eis os nossos destaques e análise do que aconteceu em Nice e das implicações que terá.

  • Áreas Marinhas Protegidas

Portugal assumiu um papel de protagonismo neste campo, ao anunciar aquele que será um grande passo na conservação do seu património natural marinho. O monte submarino Gorringe irá até ao final do ano ver reforçado o seu estatuto de conservação, com uma ampliação da área total e passando uma percentagem desta a ser designada de proteção total. O Gorringe foi classificado como Zona Especial de Conservação (ZEC) em 2015, o que permitia, no entanto, várias atividades extrativas dentro dos seus limites que a partir de agora serão proibidas ou muito limitadas.

A Sciaena saudou esta decisão mas segundo Henrique Folhas, responsável pelos temas das Áreas Marinhas Protegidas e Restauro da Natureza, “ há que dar continuidade a este anúncio, nomeadamente com a designação da Rede de Áreas Marinhas Protegidas (AMP) de Portugal continental e, sobretudo, com a adoção de medidas que tornem efetiva a proteção, nomeadamente assegurando que as práticas de pesca destrutiva e outras atividades extrativas que comprometem os objetivos de conservação destas áreas são efetivamente proibidas em pelo menos 10% da rede.”

Portugal tem atualmente cerca de 7% das áreas costeiras e marinhas sob jurisdição nacional classificadas como AMP. Desde a primeira UNOC (que decorreu em Nova Iorque em junho de 2017), que Portugal tem vindo a apresentar sucessivos compromissos sobre este assunto, tendo a Ministra do Ambiente Maria da Graça Carvalho reforçado já no decorrer da 3a UNOC o compromisso  de proteger cerca de 30% do seu espaço marítimo nacional até 2030.

Para além da Ministra do Ambiente, também o Primeiro Ministro reforçou em Nice as compensações financeiras que serão atribuídas aos pescadores afetados pela limitação de áreas de pesca devido à criação de Áreas Marinhas Protegidas, tanto em áreas já designadas – como a Pedra do Valado – ou em áreas em processo de designação.

Gonçalo Carvalho, Coordenador Executivo da Sciaena salienta que, “é importante o apoio aos pescadores para se adaptarem à criação das novas AMP, mas é essencial que este se foque na transição para pesca de baixo impacto e na criação de atividades económicas complementares, nomeadamente as que beneficiam e dependem da conservação do ambiente”.

Infelizmente poucos foram os países que acompanharam Portugal neste tema. O Plano de Ação de Nice, onde ficaram descritos os compromissos assumidos na UNOC, confirma que apenas um pequeno número de países tomou medidas para proteger as AMP, enquanto a grande maioria não tomou qualquer ação decisiva para impedir a pesca destrutiva, como a pesca de arrasto pelo fundo, nestes preciosos habitats marinhos.

Henrique Folhas, em representação da Sciaena no evento " Innovating and Enforcing for a Protected Ocean (30×30): MPA Networks and the Power of Coalition to Scale Impact)"
  • Pacto Europeu para o Oceano e transição para pescas de baixo impacto

Esta falta de ambição para as AMP no caso da UE é preocupante, tendo em conta a recente publicação do Pacto Europeu para os Oceanos pela UE, que foi apresentado pela Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, na UNOC. O Pacto afirma dar prioridade à proteção e recuperação da saúde dos oceanos, o que está de acordo com os compromissos existentes na UE, incluindo o Plano de Ação para o Meio Marinho, que apela aos Estados-Membros para que eliminem progressivamente a pesca de arrasto pelo fundo nas AMP. No entanto, apenas um pequeno número de Estados-Membros da UE tomou medidas efetivas para proteger as AMP.

Segundo Henrique Folhas, “é necessário acabar com a contradição entre dizer que a UE está comprometida com a conservação do Oceano e continuar a permitir atividades altamente impactantes no seu espaço marinho e, ao mesmo tempo, não potenciando atividades económicas mais sustentáveis”.

  • Tratado Global dos Plásticos

A UNOC3 foi um momento muito importante na luta contra a poluição por plásticos. O principal marco foi a Declaração de Nice apresentada pela França e assinada por 95 países, incluindo os 27 Estados-Membros da UE. Esta declaração, o “Alerta de Nice para um tratado sobre os plásticos ambicioso” (The Nice wake up call for an ambitious plastics treaty), representa uma pressão coletiva significativa para garantir que o tratado final, a ser fechado no INC-5.2, seja robusto e eficaz no combate à poluição por plásticos em todo o seu ciclo de vida.

Estes países exigem um tratado ambicioso e universal, que seja juridicamente vinculativo e que tenha a capacidade de evoluir de acordo com as evidências científicas disponíveis e novas que possam surgir, bem como com as realidades e contextos sociopolíticos dos diferentes países que eventualmente irão ratificar o tratado.

As prioridades levantadas pelos países assinantes da declaração incluem a redução da produção e consumo de plásticos, a eliminação legalmente vinculativa dos produtos plásticos mais problemáticos e químicos preocupantes, e as obrigações para melhorar o design dos produtos de plástico, com foco no design ecológico e a economia circular. Os países assinantes reconhecem no documento a importância de um mecanismo financeiro novo e específico para o tratado, que seja acessível e esteja baseado no princípio do “poluidor-pagador”, e que tenha especial atenção aos países menos desenvolvidos e pequenas ilhas.

Valentina Muñoz, Técnica de Lixo Marinho e Comunidades da Sciaena, destaca que “Esta declaração é muito importante e um sinal claro do compromisso que a maioria dos países envolvidos nas negociações do tratado global dos plásticos tem adotado para garantir a ambição necessária para realmente acabar com a poluição por plásticos.” 

As prioridades são claras, mas é necessária muita coragem política e acordos ambiciosos. “O conflito de interesse deve ficar fora deste tratado e, até agora, temos visto estratégias por parte de alguns países para diluir a ambição do tratado”, acrescentou.  

Ainda há assuntos pendentes a serem abordados, como as regras de procedimento para adotar o tratado. Isto poderá ser um obstáculo para a conclusão do instrumento a tempo e com a ambição necessária. Valentina tem vindo a seguir as negociações do Tratado Global dos Plásticos desde o INC-2 em Paris, esteve no INC-3 em Nairobi, no INC-4 em Ottawa, no INC-5 em Busan, e irá participar no INC-5.2 a decorrer no mês de Agosto em Genebra. Neste âmbito, Valentina sublinha que “É importantíssimo que os países que assinaram esta declaração na UNOC3 mantenham a força, o compromisso e a ambição levantada no INC-5 em Busan para termos um tratado efectivo e eficaz.”

  • Mineração em mar profundo

Catarina Abril, Técnica de Pescas e Clima da Sciaena, sublinha ainda que “esta UNOC foi marcada por uma forte e transversal demonstração de apoio a uma moratória à mineração em mar profundo, incluindo por parte das instituições europeias. Para além da exclusão clara desta atividade no âmbito do Pacto Europeu para os Oceanos, destaca-se como passo significativo o reconhecimento, por parte do Presidente do Conselho Europeu, António Costa, de que o avanço desta atividade é um risco que não nos podemos dar ao luxo de correr”. 

Aos 33 países que compõem a coligação de países a favor de uma moratória global à mineração em mar profundo juntam-se agora a Letónia, Ilhas Marshall, Eslovénia e Chipre. “A adesão de mais países a esta coligação é um enorme sinal de coragem política perante a ameaça iminente de avanço desta indústria, que tem tentado contornar o processo multilateral a decorrer na Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos” , acrescenta. 

Em conclusão,

Joana Coelho da equipa de Comunicação da Sciaena, que esteve presente na 3ª edição da UNOC em Nice, refere que “Para além de vermos Portugal anunciar alguns avanços na proteção do oceano, a UNOC foi ótima para fortalecer relações com parceiros estratégicos, como a Seas At Risk e a Deep Sea Conservation Coalition. O contacto direto com as diferentes equipas foi fundamental para perceber melhor as diferentes formas de trabalhar e comunicar de cada ONG e entidade, e reforçar laços com quem partilha os mesmos objetivos.”

 “Reforçamos assim a importância da colaboração e da partilha de experiências, abordagens e perspectivas diversas, essenciais para avançarmos de forma mais coordenada e eficaz na defesa do oceano e na sensibilização da sociedade civil” conclui.

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